Do MarketING ao marketing digital: a evolução da educação a distância no Brasil

Com mais de 100 anos de história, a educação à distância hoje é a principal modalidade para cursos como os de Licenciatura, que representam 2 em cada 10 alunos do Ead

“Eu fiz um curso por correspondência de marketing, logo que surgiu o marketing. Inclusive as pessoas nem falavam ‘marketing’, elas falavam ‘marketíngue’, depois que a gente foi aprender que pronúncia estava errada.”

Luiz Carlos Farias, o Sr. Farias como é conhecido pelos amigos, acompanhou de perto a evolução da oferta de cursos a distância. O professor de 67 anos, teve sua primeira experiência com o ensino a distância nos anos 1970, ao fazer um curso via correspondência pelo Instituto Universal do Brasil. “Você fazia a matrícula, se inscrevia no curso, eles te mandavam pelo correio o material didático e a prova, você fazia a prova, botava no envelope e despachava pelo correio de volta. Não era esse Ead que a gente conhece hoje, né? (A internet) facilitou muito, sem dúvida alguma”, explica.

A transformação que Farias testemunhou é parte de uma mudança fundamental para a evolução do ensino a distância no Brasil. Com início tardio, a partir do século XX, a modalidade passou por diversas fases até adotar a forma que conhecemos hoje, em que estudantes e professores são conectados por meio do uso de tecnologias de ensino, com recursos como tutoria virtual e videoaulas. Os livros didáticos, contudo, não foram totalmente substituídos, já que muitos cursos ainda contam com apostilas físicas como parte do material pedagógico.

O pontapé inicial para o Ead no Brasil aconteceu no ano de 1904 com a instalação de escolas internacionais que ofereciam conteúdos profissionalizantes, como caligrafia e corte e costura via correspondência. Já a partir de 1923, com a fundação da Rádio Sociedade, no Rio de Janeiro, a educação a distância ganha outro suporte para sua transmissão. Na era da radiodifusão educativa, os conteúdos veiculados eram diversos, com cursos voltados para qualificação a comerciários, formação continuada de professores, educação religiosa e cultural e até experiências com letramento de jovens e adultos.

Na virada das décadas de 1940 para 1950, com a instalação do Instituto Monitor e do Instituto Universal Brasileiro, a educação a distância adota um caráter técnico-profissionalizante. “Quando chega a época da segunda guerra mundial, o Brasil é proibido de importar objetos como rádios e motores. Quando esses objetos estragavam, tinha que consertar aqui mesmo. É nesse momento que surge a educação por correspondência para mão de obra masculina, com assuntos como eletrotécnico, radiotécnico, chaveiro, mecânica de motores”, conta o pesquisador João Vianney, autor do livro “A Universidade Virtual no Brasil” e especialista em educação a distância. O modelo de educação por correspondência, torna-se então muito popular e atinge um público variado por todo o país. Assim como o Sr. Farias, até os anos 2000 mais de três milhões de alunos foram formados em cursos de iniciação profissionalizante via correspondência.

Propaganda do Instituto Universal Brasileiro publicada em revista, 1968. Imagem: Marko Mello/Flickr

A partir da década de 1960, com a publicação do Código Brasileiro de Telecomunicações, a televisão passou a ser adotada como meio de difusão de conteúdo educativo em grande escala, com a intenção principal de oferecer a educação de jovens e adultos por meio da teleducação. Entre os cursos mais famosos, o Telecurso 2000 e o Telecurso Madureira, com educação supletiva de primeiro e segundo grau, marcaram esse período.

Cinco cursos superiores Ead - e contando

Depois do curso de marketing a distância por correspondência, Farias passou um período longe dos livros didáticos, até que sentiu que era  hora de voltar a estudar: “Eu trabalhava com vendas e tive a oportunidade de ser promovido, mas para isso, de acordo com a política da empresa, eu tinha que ter uma graduação”, explica. A primeira experiência no ensino superior, em 2007, foi presencial: Tecnologia em Processos Gerenciais, pelo Senac. 

Já formado, não demorou muito para Farias voltar à sala de aula, dessa vez não mais com a tradicional lousa e carteiras. Um ano após o término da primeira graduação, ele foi convidado para dar aulas nos cursos técnicos do Senac, onde teve seu primeiro contato com o ensino a distância. “Surgiu a oportunidade de fazer uma especialização Latu Sensu à distância na área de docência para o ensino profissional. Então ali eu comecei a pegar o gosto, inicialmente eu achei meio estranho, porque eu estava acostumado com a aula presencial e de repente, não tinha contato direto com o professor, tinha que abrir o notebook, ler o conteúdo e participar dos fóruns e estudos de casa, tudo sozinho, né?”, recorda Farias.

Luiz Farias exibe o diploma da pós-graduação em Gestão de Recursos Humanos, na Faculdade Batista de Minas Gerais, que concluiu de maneira remota. Foto: arquivo pessoal.

O estranhamento inicial deu lugar a um entusiasmo pela aprendizagem continuada. Desde então, Farias já fez mais duas especializações, finalizou uma nova graduação, em Administração, e agora cursa Marketing Digital, tudo à distância. Perguntado se pretende buscar outro curso quando terminar Marketing, ele responde: “Eu gostaria de fazer direito. Mas aí teria que ser presencial, já que não é permitido direito Ead”.

As ferramentas que passaram a ser essenciais no processo de aprendizagem à distância do Sr. Farias nesta nova era da tecnologia da informação, começaram a ser desenvolvidas muito antes. A partir da década de 1980, as universidades públicas assumiram um papel de vanguarda no desenvolvimento da estrutura técnica e pedagógica para a abertura de cursos superiores à distância. Entre as primeiras experiências com a Ead no ensino superior, destacam-se os cursos de extensão oferecidos pela Universidade de Brasília (UnB) em parceria com a inglesa Open University, que até 1983, atingiram cerca de 30 mil alunos, segundo Pandini (2020) em sua tese de doutoramento.

A pedra fundamental para a oficialização da oferta de cursos superiores a distância, no entanto, data de 1996, com a promulgação da  Lei de Diretrizes e Bases para a educação Nacional (LDB - LEI Nº 9.394), que autoriza e estabelece as condições básicas para a oferta de cursos de terceiro grau nessa modalidade. Nesse período, com a evolução tecnológica e comunicacional, entram em cena também novas possibilidades para o processo de ensino e aprendizagem a distância. A fim de desenvolver soluções para a expansão do Ead no Brasil surgem grupos de pesquisa para desenvolvimento dessas ferramentas, entre eles o Laboratório de Ensino a Distância da Universidade Federal de Santa Catarina (LED-UFSC). João Vianney atuou como coordenador do projeto entre os anos de 1995 e 2000. “A partir da LDB de 1996, duas vertentes se estabelecem no Brasil. Uma que nasce no NEAD - Núcleo de Educação a Distância da Federal do Mato Grosso, que vai fazer a formação de professores Ead sem utilizar novas tecnologias e outra aqui na Universidade Federal de Santa Catarina, através da parceria com empresas para o financiamento dessa tecnologia”, relata Vianney.

O cenário era de grande inovação tecnológica, com forte colaboração entre o LED-UFSC e representantes de universidades estrangeiras, com ampla expertise na oferta de cursos Ead. Entre eles, a UFSC recebeu a visita de Michel Moore, pesquisador responsável pelo desenvolvimento da Open University - referência mundial em ensino a distância. Vianney ainda ressalta o pioneirismo das atividades do grupo: “Foi uma grande ruptura. O LED-UFSC atingiu grandes feitos, como a criação do primeiro ambiente virtual do Brasil, a primeira aula teletransmitida com interação com os alunos foi também feita na Universidade Federal de Santa Catarina, por videoconferência”.

Para o pesquisador, outro avanço importante realizado pela universidade foi a formação de líderes para atuar com as novas tecnologias empregadas na educação a distância, por meio da criação do curso de Mestrado em Mídia e Comunicação. “Além de desenvolver as matrizes tecnológicas, a UFSC também formou cerca de 500 a 700 profissionais que hoje são os diretores de inovação tecnologia EAD de universidades por todo país”, reforça Vianney.

Contemporâneas à experiência do LED-UFSC estão instituições como a Universidade de Brasília (UnB), Universidade Federal de São Paulo  (UNIFESP), Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul  (UFGRS), com grupos de pesquisa e cursos pioneiros na modalidade a distância no Brasil.

Formação de professores na vanguarda do ensino a distância

Entre as mudanças trazidas pela Lei de Diretrizes e Bases aprovada em 1996, está a exigência de que, em 10 anos, os professores de ensino fundamental e médio deveriam ter diploma de ensino superior para atuar nas salas de aula. “Na década de 1980 os professores, principalmente os que trabalhavam nos anos iniciais, em muitas regiões do país eram professores leigos, ou seja, professores sem formação. E quando  se fala em educação infantil, que só foi ser reconhecida a partir de 1996 com a LDB, mais ainda, porque  na maioria dos municípios, a educação infantil ficava no campo da Assistência Social, então a gente discutia muito essa questão da profissionalização dos professores, de todos serem formados em cursos superiores” conta Suzane da Rocha, presidente da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE).

A fim de cumprir esse objetivo, um dos caminhos apontados pela LDB em seu artigo 62 é a utilização da educação a distância para oferta de cursos de formação de professores. Segundo o livro “A Universidade Virtual no Brasil”, até 2002, das 28 instituições de ensino cadastradas oficialmente ou autorizadas pelo MEC para oferta de cursos na modalidade a distância, 14 ofereciam cursos de Licenciatura e 3 ofereciam cursos de especialização em educação.

Uma das universidades pioneiras nesse contexto foi a Universidade do Estado de Santa Catarina - (UDESC). Carmen Pandini acompanhou de perto a criação do curso de pedagogia Ead da UDESC, do qual já foi coordenadora e hoje é presidente do colegiado de ensino e professora. “A partir da década de 1990, a UDESC se aproxima da modalidade a distância, principalmente para formar os quadros de magistério do estado de Santa Catarina, já que nós tínhamos muitos professores leigos”, relata Carmen. Segundo ela, o pontapé inicial rumo à abertura do primeiro curso de pedagogia Ead do estado foi a preparação da equipe de trabalho, por meio da especialização em Ensino a Distância oferecida pela Universidade Nacional de Brasília (Unb).

Com a aprovação do curso no MEC em 1999, a turma piloto iniciou os estudos em 2000, com 240 vagas disponíveis e apoio de polos presenciais em 14 municípios da região metropolitana de Florianópolis. “Nós tínhamos uma EAD, pela época, muito avançada. Nos preocupamos muito com a metodologia, com os referenciais exigidos pela lei, a questão da comunicação, do material didático, da tutoria, da organização dos polos”, garante a professora. Ao final do período de aulas, dos 240 alunos inscritos na turma piloto, 211 concluíram o curso. Em 2001, o projeto pedagógico foi revisto e expandiu sua abrangência para 74 municípios. Com a ampliação no número de vagas disponíveis, o curso passou a atender mais de 3 mil alunos. Até hoje, a UDESC foi responsável pela formação de cerca de 20 mil alunos no curso de pedagogia Ead.

Uma dessas estudantes é Marilene José, que ingressou no curso em 2002, no polo de Ituporanga, no Alto Vale do Itajaí. Filha de agricultores da cidade vizinha de Alfredo Wagner, a catarinense iniciou seus estudos superiores três anos depois de concluir o ensino médio no Centro de Educação de Jovens e Adultos (Ceja).

Em maio de 2024, 18 anos depois da formatura no curso de pedagogia Ead,  Marilene visitou pela primeira vez a sede da instituição em Florianópolis. Em depoimento aos canais da UDESC, a egressa se emociona ao contar sobre sua experiência na universidade. “Era um sonho que eu estava começando a realizar, mas eu não acreditava que eu estava na UDESC, que eu estava em uma universidade. (...) Se não fosse a UDESC lançar esse projeto de educação a distância para todo o estado, talvez eu não estaria aqui”, conta a professora.

10 anos após a promulgação da LDB, os esforços para capacitar professores da rede fundamental e média de ensino continuavam e o Ead seguia sendo uma ferramenta para levar as universidades a diversas regiões do Brasil. Assim, em 2006 é criado o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), iniciativa que tem o objetivo de interiorizar e expandir a abrangência das instituições públicas de ensino superior por meio do ensino a distância. Nesse sistema, instituições públicas recebem apoio financeiro via editais da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) para oferta de cursos superiores nessa modalidade, preferencialmente na categoria licenciatura.

Para Rita Borges, diretora da Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED), a UAB desempenha um papel essencial de levar educação superior a municípios desassistidos por universidades presenciais. “A importância da UAB até os dias de hoje é reduzir as desigualdades na oferta do ensino superior e desenvolver um amplo sistema público nacional de educação a distância, porém ainda falta muito a fazer para preencher as lacunas de educação nesse grande país que é o Brasil”, conclui.

20 anos depois, o Ead é a regra nos cursos de licenciatura

Além dos programas públicos, como a UAB e o Parfor - Programa Nacional de Formação de Professores, os cursos de licenciatura a distância se expandiram principalmente na rede privada de ensino, tornando-se as carreiras com maior percentual de estudantes na modalidade Ead em relação ao presencial. Dessa maneira, a formação de educadores a distância, que no começo dos anos 2000 era alternativa, tornou-se um padrão. Em 2022, mais de 80% dos estudantes que ingressaram em algum curso de licenciatura no Brasil optaram pela modalidade Ead para estudar.

Sara Kawani é uma das estudantes que segue essa tendência. Ela entrou no curso de licenciatura em matemática no Instituto Federal do Mato Grosso pela UAB em 2024, no polo de Juara. “Eu escolhi o Ead para conseguir me graduar do conforto da minha casa. Então se eu tivesse que ir, digamos que a aula fosse à noite, eu teria que sair umas 18 horas e deixar meu filho em casa, para estar lá às 19 horas. Também tem o gasto e o cansaço de voltar às 22h para casa”, explica. Para a estudante, o ensino a distância tem sido a melhor alternativa para estudar enquanto cuida do Nicolas, de seis meses. “Ele é muito tranquilo, mas nos dias mais difíceis eu conto com minha família e o pai dele para me ajudar enquanto eu estudo”, conta Sara.

Em entrevista, Sara afirma que já pretendia estudar a distância mesmo antes do nascimento do Nicolas. Foto: arquivo pessoal.

Já para Giovanna Pacheco, o Ead foi o caminho mais viável para manter sua rotina de trabalho sem abrir mão de cursar uma universidade. “Para gente que mora no interior do Rio e tem uma grande demanda de afazeres de casa, trabalho, toda uma vida fora da faculdade, é a única oportunidade”. A carioca estuda Licenciatura de Letras na Universidade Federal Fluminense (UFF), polo Nova Friburgo. Além das atividades regulares da graduação, Giovanna também faz parte do CONCENTRE, movimento estudantil de representação dos estudantes Ead do Consórcio CEDERJ. “Eu optei por fazer letras por causa da pandemia, porque nessa época muita gente se formou no ensino médio com o ensino precário. Eu mesma não tive uma colação de grau, não tive um auxílio, nem um professor presente, e eu vi que muita gente assim como eu teve muita dificuldade. Eu faço letras para ser professora e o ensino que eu quero passar adiante é o ensino humanitário”, declara Giovanna.

No CONCENTRE, Giovanna atua na área comunicação e está em contato com os estudantes, recebendo as demandas e coordenando ações para resolvê-las junto da diretoria do grupo. Foto: arquivo pessoal.

O cenário atual das graduações em licenciatura, contudo, divide opiniões: de um lado, os defensores do ensino a distância argumentam que a modalidade é fundamental para a seguir capacitando educadores por todo o Brasil diante do desinteresse pela profissão. Por outro lado, há aqueles que questionam a qualidade da formação de professores a distância e defendem um limite para o Ead nesses cursos.

Para a presidente da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), Suzane da Rocha, um dos problemas trazidos pela transição de modalidade nas licenciaturas está na característica de oferta dos cursos, concentrados em poucas instituições de ensino privadas, muitas não universitárias, ou seja, que não comportam as três esferas: pesquisa, ensino e extensão. “Hoje o desenho que boa parte dessas instituições privadas adotam é a compra de materiais didáticos prontos. E aí existem duas ou três grandes empresas que produzem esses materiais, então a gente forma professores que não leem uma obra clássica, que não leem artigos dos periódicos que são publicados, que são textos de pesquisas atuais, porque eles trabalham em cima desses livros prontos para cada disciplina. Além disso, as aulas são videoaulas compradas de professores que eles nunca vão interagir, porque essas videoaulas são prontas e eles têm um tutor para 1.000 alunos, que não consegue fazer trabalho de mediação pedagógica, de fato”, observa Suzane. Outra preocupação da instituição é a falta de controle sobre os estágios pedagógicos exigidos ao longo da formação. “Há denúncias de cursos em que o estágio e as práticas pedagógicas não acontecem nas escolas. Isso trouxe um cenário para a formação de professores gravíssimo. Então, a gente vai vendo que a formação a distância ela tá sendo totalmente precarizada”, lamenta a professora gaúcha.

Já para Natália Fregonesi, Coordenadora de Políticas Educacionais do Todos Pela Educação, além da expansão indiscriminada do Ead, o cenário atual da formação de professores apresenta ainda outros desafios a serem enfrentados. “A gente tem três problemas grandes (na formação de professores hoje) que são: primeiro, a ociosidade de vagas em cursos superiores: os estudantes não estão procurando esses cursos de graduação na formação de professores. Segundo, a evasão: os estudantes começam o curso, mas a grande maioria não conclui. E, em terceiro lugar, a não busca por ingressar no mercado como professor, então esses profissionais estão se formando e indo para outros trabalhos”, alerta Natália.

De acordo com dados do Censo da Educação Superior de 2022, tanto na modalidade presencial, quanto no Ead, as condições para a conclusão nos cursos de educação superior segue sendo um desafio no Brasil. Ao analisar a trajetória dos alunos que ingressaram em 2013, em uma série histórica de 2013 a 2022, as taxas de conclusão e de desistência acumulados no período são muito similares entre as duas modalidades. Em média 40% concluem a graduação ao final da série analisada, enquanto cerca de 60% evadem.

Fonte: Gráfico retirado dos Relatórios Técnicos Censo da Educação Superior 2022 - INEP.

Ao analisar os cursos com maior taxa de desistência acumulada, as carreiras de licenciatura se destacam. Em ordem: Física (72%),  Matemática (67%), Química (67%), Filosofia (65%), Língua Estrangeira (64%), Sociologia (61%)  e Língua Portuguesa (61%) , todas essas com Taxa de Desistência Acumulada superior à média nacional para todos os cursos, que é de 58%. Natália analisa os indicadores: “Os jovens cada vez menos estão querendo se tornar professores. Mais do que ofertar mais vagas em cursos na modalidade Ead, o que a gente precisa é de fato tornar a carreira docente mais atrativa. Ter melhores condições de trabalho, ter salários mais competitivos, ter uma carreira que seja mais sustentável ao longo do tempo. Então tem muitos aspectos da carreira docente que precisam ser revistos para que a gente consiga evitar esse apagão docente”, pondera.

Vagas de sobra em cursos superiores, professores em falta nas escolas básicas

O “apagão docente” ao qual Natália se refere, é uma tendência que vem sendo apontado por especialistas há alguns anos e em 2022 foi reforçada pelo estudo desenvolvido por pesquisadores do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), intitulado “Carência de professores na educação básica: risco de apagão?”.

No documento, são analisados uma série de dados para entender se há, de fato, o risco de um esvaziamento de docentes com formação adequada em disciplinas como artes, sociologia e física, por exemplo, nos anos finais do ensino fundamental e ensino médio no Brasil.  Entre as variáveis analisadas estão a categoria administrativa, pública ou privada, das instituições que recebem os ingressantes de cursos de licenciatura, e a modalidade escolhida para desenvolvimento do curso, conforme o gráfico a seguir.

Fonte: Gráfico retirado do relatório "Carência de professores na educação básica: risco de apagão?" - INEP.

Além dessas informações, também são considerados na análise, dados como: 

  • quantidade de professores atuantes com formação adequada à disciplina que ministram nas salas de aula;
  • número de ingressantes e concluintes de cursos de licenciaturas;
  • relação entre concluintes totais e novos professores nas redes básicas de ensino, para descobrir a proporção de profissionais que de fato atuam na docência após o término do curso;
  • estimativa de demanda imediata de professores nos anos finais do ensino fundamental e ensino médio no Brasil. 

Entre as principais conclusões apontadas no documento, o risco de apagão de professores qualificados para ministrar disciplinas é destacado pelos pesquisadores. “Levando em conta esses resultados, não é exagero dizer que já estamos vivenciando um ‘apagão’ de professores com formação adequada em vários componentes curriculares da educação básica, particularmente nos anos finais do ensino fundamental e no ensino médio. E, se continuar tudo como está, principalmente em termos da atratividade da carreira docente, esse “apagão” de professores poderá se agravar”. O estudo, no entanto, esclarece que o motivo desse fenômeno não é a quantidade de vagas disponíveis para formação de educadores. “A carência de professores no País não se deve à falta de vagas nos cursos de licenciatura, mas sim à baixa atratividade da carreira do magistério, que é considerada como uma das principais causas associadas ao déficit de docentes no Brasil”, conclui o documento.

Não faltam vagas em instituições de ensino superior para formação de professores. Pelo contrário, as vagas em cursos de licenciatura a distância, bem como nos demais cursos na modalidade, se multiplicam ano após ano, espalhadas por todo país. Mesmo assim, quando analisamos as características das universidades com maior número de alunos matriculados, o cenário se repete: instituições privadas, pertencentes a grandes grupos educacionais, muitos deles com ações cotadas na bolsa de valores. Muitas vagas, pouca diversidade na oferta. Esse é o assunto da próxima reportagem desta série. Vamos lá?

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